Por que algumas experiências são mais prazerosas do que outras? Por que valorizamos tanto certos objetos, mesmo quando sua utilidade prática é limitada? E, principalmente, por que, apesar de vivermos em um mundo com infinitas opções de conforto e entretenimento, muitas pessoas não se sentem mais felizes? Essas questões foram exploradas pelo psicólogo Paul Bloom, trazendo reflexões fascinantes sobre a relação entre prazer, felicidade e contexto.
O Prazer está na história que contamos
Nosso prazer não vem apenas da experiência sensorial em si, mas da história e do significado que associamos a ela. Um exemplo clássico disso ocorreu durante a Segunda Guerra Mundial, com Hermann Goering, braço direito de Hitler. Goering era um ávido colecionador de arte e desejava desesperadamente uma pintura de Vermeer, um dos artistas mais valorizados da época. Quando finalmente conseguiu comprar uma por milhões de dólares, tornou-se sua posse mais valiosa.
O que ele não sabia era que a pintura era uma falsificação. O comerciante holandês que a vendeu, Han van Meegeren, foi preso por colaborar com os nazistas, mas provou sua inocência ao pintar outro “Vermeer” na prisão. Ele acabou se tornando um herói na Holanda por ter enganado Goering.
Esse caso ilustra um ponto crucial: o valor de um objeto não depende apenas da sua aparência ou utilidade, mas da história que o acompanha.
Isso se aplica a muitos aspectos da vida cotidiana. Estudos mostram que, se apresentarmos o mesmo vinho em duas garrafas diferentes – uma comum e outra sofisticada –, as pessoas tendem a preferir o vinho que parece mais caro. Mais do que isso: quando acreditam estar bebendo um vinho mais caro, as áreas do cérebro associadas ao prazer são mais ativadas.
O mesmo fenômeno acontece com objetos ligados a figuras públicas. Tacos de golfe usados por John F. Kennedy foram leiloados por 750 mil dólares, não porque eram extraordinários, mas porque estavam associados a uma figura histórica. Da mesma forma, um bilionário saudita ofereceu 10 milhões de dólares pelo sapato que foi atirado contra George W. Bush durante uma conferência no Iraque.
O contexto influencia nossa percepção
O ambiente e a forma como algo nos é apresentado alteram significativamente nossa experiência. Um exemplo curioso disso foi um experimento feito com crianças: quando alimentos saudáveis foram colocados dentro de uma sacola do McDonald’s, as crianças passaram a gostar mais deles, associando a marca à qualidade da comida.
Isso também se aplica a adultos. Se um mesmo vinho for servido em uma garrafa barata e em outra cara, as pessoas geralmente preferem o da garrafa sofisticada, mesmo que o conteúdo seja idêntico.
Nosso contexto também influencia a dor. Estudos mostram que, quando acreditamos que a dor está sendo infligida intencionalmente, a percepção de sofrimento aumenta. Ou seja, o que pensamos sobre algo afeta diretamente o quanto sentimos prazer ou dor.
A Síndrome de Capgras, um transtorno neurológico raro, reforça essa ideia. Pessoas com essa síndrome acreditam que seus entes queridos foram substituídos por réplicas idênticas. Isso ocorre porque existe um caminho duplo para reconhecer alguém: um consciente e explícito, e outro emocional, que nos dá uma sensação intuitiva de familiaridade. Na Síndrome de Capgras, essa conexão emocional está comprometida, tornando os rostos conhecidos estranhos e ameaçadores. Esse transtorno pode levar a desfechos trágicos, com familiares atacando ou até matando aqueles que acreditam ser impostores.
Felicidade: Entre a adaptação e as expectativas
Apesar de todas as inovações tecnológicas e das facilidades modernas, os níveis de felicidade nos Estados Unidos permaneceram praticamente inalterados entre 1946 e 2006. O psicólogo Barry Schwartz sugere que isso pode estar ligado ao paradoxo da escolha: quando temos muitas opções, tomar uma decisão se torna mais difícil e aumenta a chance de arrependimento. Isso se aplica a compras, carreiras e até relacionamentos.
Além disso, os seres humanos possuem um forte mecanismo de adaptação, conhecido como lógica do set point. Eventos extremamente positivos ou negativos afetam nossa felicidade apenas temporariamente, e depois tendemos a retornar ao nosso nível emocional habitual. Ganhadores da loteria experimentam um pico de felicidade, mas, em pouco tempo, voltam ao mesmo nível de satisfação anterior. O mesmo ocorre com vítimas de lesões graves – após um período de tristeza, muitas encontram formas de se adaptar e retomar a vida.
Uma das poucas exceções a essa regra é a cirurgia plástica. Pessoas insatisfeitas com sua aparência relatam um aumento significativo e duradouro na felicidade após passarem por procedimentos estéticos.
Além disso, o psicólogo Dan Gilbert propõe que temos um “sistema imunológico psicológico”, que nos ajuda a encontrar sentido e positividade mesmo em experiências negativas. Muitas pessoas que enfrentam dificuldades acabam dizendo que aquilo foi “a melhor coisa que lhes aconteceu”. Esse mecanismo nos permite reinterpretar eventos ruins de forma positiva, promovendo resiliência.
O que influencia nossa felicidade?
Diversos fatores podem impactar nossa felicidade, nem sempre da forma que imaginamos:
• Genética: A felicidade tem um forte componente genético. Se seus pais biológicos eram felizes, há uma grande chance de que você também seja.
• Idade: A felicidade segue um padrão curioso ao longo da vida. Ela tende a ser alta na juventude, cai na meia-idade (por volta dos 50 anos) e depois volta a subir na velhice.
• País de Origem: Países mais ricos e seguros tendem a ter habitantes mais felizes. No Brasil, a felicidade tem caído consistentemente nos últimos anos.
• Dinheiro: Dinheiro e felicidade estão ligados, mas apenas até certo ponto. Após um certo nível de renda, o dinheiro faz pouca diferença na satisfação pessoal.
• Casamento: O casamento aumenta a felicidade no início, mas, ao longo do tempo, pessoas casadas não são significativamente mais felizes do que solteiras.
• Filhos: Apesar da crença de que ter filhos traz felicidade, pesquisas indicam que a felicidade dos pais geralmente diminui após o nascimento dos filhos e só volta a subir quando eles saem de casa.
• Religião: Países religiosos tendem a ser menos felizes, embora a religiosidade individual possa ser um fator de proteção contra a depressão.
Nosso prazer e felicidade não são determinados apenas por fatores externos, mas por como percebemos e interpretamos nossas experiências. O que pensamos sobre algo influencia diretamente como nos sentimos.
Se há uma lição a tirar dessas reflexões, é que podemos ajustar nossa perspectiva e expectativas para moldar melhor nossas experiências. Afinal, muitas vezes, a felicidade não está no que temos, mas na maneira como enxergamos o que temos.
DR. OSVALDO MARCHESI JUNIOR
Psicólogo em São Paulo - CRP - 06/186.890
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Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) e Hipnoterapia.
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