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Ganho Secundário (Psicologia): Por que às vezes resistimos à mudança?

Artigo Publicado: 14/10/2025
Por Osvaldo Marchesi Junior, Psicólogo | CRP 06/186.890 – Terapia Cognitivo-Comportamental

Ganho Secundário - Psicologia - TCC - Osvaldo Marchesi Junior - NeuroFlux

Em muitos atendimentos clínicos, percebo algo intrigante: o sofrimento que o paciente diz querer eliminar é, ao mesmo tempo, aquilo que o protege de dores ainda mais profundas. Ele reclama da ansiedade, mas sem ela talvez perdesse a atenção da família. Sofre com a depressão, mas teme que, ao melhorar, precise lidar com responsabilidades das quais o sintoma o isenta. É nesse paradoxo silencioso que surge o ganho secundário, um dos fenômenos mais sutis — e mais desafiadores — da psicologia clínica.

Ao longo dos anos, percebi que grande parte da resistência à mudança psicológica não nasce apenas de falta de vontade, mas de benefícios inconscientes que o sofrimento oferece. O ganho secundário é como um laço invisível entre o indivíduo e o sintoma: ele gera dor, mas também cumpre uma função.

Entender essa dinâmica é essencial para romper padrões de autossabotagem e evoluir emocionalmente.

Neste artigo, quero compartilhar — de forma acessível, mas com base técnica sólida — o que é o ganho secundário na psicologia, como ele se manifesta, de que forma interfere na terapia cognitivo-comportamental (TCC) e, principalmente, como você pode identificá-lo em si mesmo para começar a superá-lo.

O que é ganho secundário na psicologia?

O ganho secundário é o benefício psicológico, emocional ou social que uma pessoa obtém — de forma consciente ou inconsciente — ao manter um sintoma, comportamento ou sofrimento. Em outras palavras, é aquilo que a pessoa “ganha” com o próprio problema, mesmo que sofra com ele.

Na clínica, o ganho secundário costuma aparecer de forma sutil: uma paciente com crises de ansiedade pode, sem perceber, receber mais cuidado da família quando está mal; alguém com dores psicossomáticas pode evitar tarefas que teme realizar; um indivíduo deprimido pode encontrar no isolamento uma forma de proteção contra o medo de rejeição.

O ponto-chave é que o sintoma passa a ter uma função psicológica adaptativa, ainda que disfuncional. Ele se torna uma espécie de refúgio emocional — um modo de equilibrar internamente o medo, a culpa ou a insegurança.

Ao reconhecer o ganho secundário, o psicólogo pode compreender não apenas o que causa o sofrimento, mas também o que o mantém. Isso muda completamente a abordagem terapêutica: o foco deixa de ser “eliminar o sintoma” e passa a ser entender o papel que ele cumpre na vida do paciente.

Diferença entre ganho primário e ganho secundário

Para entender melhor o conceito, é importante distinguir ganho primário de ganho secundário.

O ganho primário refere-se à redução da tensão interna provocada por um conflito psíquico. Por exemplo, uma pessoa que reprime raiva intensa pode desenvolver sintomas físicos (como dor de cabeça) que aliviam simbolicamente essa emoção reprimida — o sintoma é uma forma de “solução” inconsciente do conflito.

Já o ganho secundário surge das recompensas externas ou benefícios emocionais indiretos que o sintoma proporciona. Pode ser atenção, cuidado, isenção de responsabilidades, ou até uma identidade de “alguém que sofre”, que gera pertencimento e sentido.

Esses ganhos não são conscientes. Nenhum paciente diz: “vou ficar ansioso para receber atenção”. Trata-se de um processo interno sutil, que opera abaixo do nível da consciência e, por isso, é tão difícil de perceber e romper.

Por que o ganho secundário é tão resistente à mudança?

O ganho secundário é resistente porque ele cumpre uma função de segurança emocional. Quando o sofrimento traz algum tipo de benefício, ainda que disfarçado, a mente o “mantém” como uma forma de autoproteção.

Durante a terapia, noto com frequência algo curioso: o paciente racionalmente deseja mudar, mas inconscientemente teme perder o que o sintoma oferece. Essa tensão interna gera comportamentos de autossabotagem e resistência à mudança.

Um exemplo comum é o paciente que melhora, mas logo depois apresenta recaídas sem motivo aparente. Quando investigamos, descobrimos que, ao melhorar, ele sentiu que perderia o suporte afetivo que recebia durante as crises. A recaída, nesse caso, não é fracasso, mas uma tentativa inconsciente de restaurar o vínculo de cuidado.

Essa dinâmica se torna ainda mais forte quando o ganho secundário se liga a crenças centrais — ideias profundas sobre si e sobre o mundo. Por exemplo: “só sou amado quando estou fraco”, “não posso ser feliz porque isso seria egoísmo”, ou “se eu melhorar, vão esperar demais de mim”.

Essas crenças, muitas vezes formadas na infância, fazem com que o sintoma se torne uma forma de preservar a identidade e evitar o medo da perda emocional.

Do ponto de vista psicológico e neurobiológico, o cérebro associa familiaridade a segurança. Por isso, manter o sofrimento conhecido é, em certo sentido, mais confortável do que enfrentar o desconhecido da mudança.

Assim, o ganho secundário é uma tentativa de controle diante da incerteza — ele estabiliza o caos interno, mesmo que à custa do próprio bem-estar.

Ganho Secundário na Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC)

Na Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC), o ganho secundário é entendido como um reforço indireto que mantém padrões disfuncionais de pensamento e comportamento.

Quando algo produz sofrimento, mas ao mesmo tempo oferece recompensas emocionais ou relacionais, o cérebro tende a repetir esse padrão — mesmo que ele seja prejudicial.

Durante a terapia, costumo explorar o que o paciente “ganha” ao manter determinado comportamento. Às vezes, o ganho é sutil: a evitação da ansiedade pode proporcionar alívio imediato; a tristeza pode atrair empatia; a dependência emocional pode manter vínculos que, de outra forma, seriam rompidos.

Por meio de técnicas cognitivas e comportamentais, como o questionamento socrático, a seta descendente e a análise funcional, o terapeuta ajuda o paciente a identificar esses reforços ocultos e substituí-los por formas mais saudáveis de atender às mesmas necessidades.

Por exemplo, certa vez acompanhei uma paciente que sofria de crises de pânico recorrentes. Ao investigar, percebemos que as crises sempre aconteciam quando ela sentia que o marido se afastava emocionalmente. A ansiedade, paradoxalmente, mantinha a atenção dele. Quando compreendeu isso, ela pôde desenvolver novas estratégias de vínculo que não dependiam do sintoma.

Esse processo é delicado, pois implica enfrentar medos inconscientes, abrir mão de benefícios sutis e, sobretudo, reconstruir o sentido de segurança emocional sem o auxílio do sofrimento.

Ganho Secundário e Resistência à Mudança

A resistência à mudança é um dos fenômenos mais complexos no processo terapêutico. Em muitos casos, ela não é falta de motivação, mas o resultado direto de ganhos secundários profundamente enraizados.

Do ponto de vista comportamental, o sintoma funciona como um reforço negativo (evita algo desagradável) ou positivo (gera alguma recompensa). O cérebro aprende, então, que “manter o sintoma” é uma estratégia eficaz para reduzir desconforto — e isso é registrado nos circuitos de recompensa e evitação, ligados à amígdala e ao córtex pré-frontal.

Sob a ótica da neurociência, o cérebro busca previsibilidade. Situações familiares, mesmo dolorosas, são percebidas como mais seguras do que o incerto. Assim, o ganho secundário opera como um “mecanismo de estabilidade emocional”, impedindo o indivíduo de sair da zona conhecida.

Mudar significa abrir mão da sensação de controle, e o medo da perda é, muitas vezes, maior do que o desejo de crescimento.

Lembro de um paciente que, ao começar a se recuperar da depressão, relatou sentir um vazio inesperado. Disse: “antes eu sofria, mas sabia quem eu era; agora não sei mais.” O sofrimento havia se tornado parte da identidade — e libertar-se dele exigia reconstruir a própria narrativa de vida.

Essa resistência, embora dolorosa, é natural. O papel do terapeuta não é forçar a mudança, mas acompanhar o paciente na descoberta do que está por trás da permanência no sofrimento, com empatia e sem julgamento.

Como Identificar e Superar Ganhos Secundários

Reconhecer o ganho secundário é o primeiro passo para superá-lo. No início, pode parecer difícil, porque esses ganhos raramente são conscientes. Mas há sinais que ajudam a percebê-los.

Algumas pistas comuns:

• Dificuldade em seguir recomendações terapêuticas, mesmo compreendendo sua importância.
• Recaídas recorrentes quando a melhora começa a se estabilizar.
• Sensação de vazio ou medo quando o sintoma desaparece.
• Reforços externos (atenção, apoio, cuidados) que aumentam quando o problema se intensifica.
• Narrativas que giram em torno da identidade de “quem sofre”.

Durante a terapia, costumo propor reflexões como:

“O que você teme perder se mudar?”

“O que o seu sofrimento oferece que, de algum modo, você precisa?”

“Que novas formas de cuidado e segurança você poderia criar sem depender do sintoma?”


Essas perguntas ajudam o paciente a transformar o ganho secundário em ganho consciente — isto é, aprender a satisfazer suas necessidades de forma saudável e voluntária.

A mudança ocorre quando o indivíduo percebe que é possível manter segurança e afeto sem precisar do sofrimento como mediador.

Na TCC, esse processo pode incluir reestruturação cognitiva (para revisar crenças limitantes), treino de habilidades emocionais, e exposição gradual ao novo — sempre respeitando o ritmo do paciente.

O objetivo é que ele construa novos reforços positivos, baseados em autonomia, competência e conexão real.

Exemplos Clínicos de Ganho Secundário

Ao longo da prática, alguns exemplos ilustram bem como o ganho secundário pode se manifestar:

1. Caso de depressão:

Uma paciente dizia sentir-se “inútil” e incapaz de reagir à vida. No entanto, percebia que, quando estava mal, o marido assumia as tarefas da casa e se tornava mais atencioso. Ao compreender esse padrão, ela percebeu que, por trás da tristeza, havia um pedido não verbal de cuidado. O desafio foi aprender a pedir apoio de forma direta, sem precisar adoecer para ser vista.

2. Caso de ansiedade:

Um jovem universitário relatava crises intensas antes das provas. Descobrimos que, inconscientemente, a ansiedade o “protegia” do medo do fracasso: se ele ficasse ansioso e fosse mal, teria uma justificativa; se se saísse bem, provaria superação. A ansiedade funcionava como uma forma de controle sobre o julgamento externo.

3. Caso de relacionamento abusivo:

Uma paciente permanecia em uma relação destrutiva, mesmo reconhecendo a dor envolvida. Ao explorar os ganhos secundários, percebeu que o vínculo disfuncional a livrava de enfrentar o medo da solidão e a sensação de não merecimento. O ganho secundário era, portanto, a ilusão de segurança.

Esses exemplos mostram que o ganho secundário não é sinal de fraqueza, mas uma estratégia emocional antiga que precisa ser ressignificada.

A superação exige coragem para abrir mão do “velho conforto do sofrimento” e construir uma nova forma de estar no mundo.

O Medo da Vida Saudável

Um dos aspectos mais fascinantes do ganho secundário é o medo do que vem depois da melhora.

Sim, o medo da própria saúde.

Muitos pacientes, quando começam a evoluir, sentem um desconforto inesperado. Ficar bem exige enfrentar responsabilidades, mudanças e novas escolhas. O sofrimento, por mais paradoxal que pareça, oferece uma espécie de roteiro conhecido.

Já ouvi pacientes dizerem: “Tenho medo de melhorar e perder quem me ajuda”, ou “Se eu ficar bem, vão esperar demais de mim.

Essas frases revelam o verdadeiro desafio: a cura implica crescimento, e crescer exige deixar para trás o lugar de vítima, o papel de dependente, o escudo da dor.

O sofrimento, nesse contexto, é também uma narrativa de identidade. Rompê-la não é apenas curar sintomas — é se redefinir.

O ganho secundário é uma das forças mais invisíveis e poderosas na manutenção do sofrimento.

Ele nos faz crer que estamos lutando contra algo, quando na verdade estamos também sendo sustentados por ele.

Reconhecer isso não é culpar-se, mas compreender o próprio funcionamento psíquico com maturidade e compaixão.

Na terapia, ajudar o paciente a enxergar os ganhos ocultos é como abrir uma janela para a autonomia. O sintoma deixa de ser inimigo e passa a ser uma mensagem — um pedido inconsciente por algo legítimo: cuidado, segurança, amor ou pertencimento.

O desafio terapêutico é ensinar a pessoa a atender essas necessidades sem precisar do sofrimento.

Se você sente que está preso em um padrão que se repete, mesmo querendo mudar, talvez exista um ganho secundário sustentando essa repetição. A boa notícia é que isso pode ser transformado — e o primeiro passo é reconhecer o que o seu sofrimento tem tentado proteger em você.

Mudar é abrir mão do papel que o sintoma cumpre na sua história. É escolher a liberdade, mesmo que isso assuste.

Se você sente que algo em você quer mudar, mas outra parte resiste, talvez seja hora de olhar para o que o sofrimento ainda está tentando proteger.

A psicoterapia é o espaço onde esse diálogo interno pode finalmente acontecer — com consciência, acolhimento e transformação real. Agende, ainda hoje, a sua sessão com um psicólogo especializado através do WhatsApp.

Perguntas Frequentes sobre Ganho Secundário (Psicologia)

1. O que é ganho secundário na psicologia?

É o benefício oculto que uma pessoa obtém ao manter um sintoma ou sofrimento, como atenção, alívio ou controle, mesmo que isso cause dor.

2. Qual a diferença entre ganho primário e secundário?

O ganho primário reduz a tensão interna (como um alívio emocional inconsciente). O ganho secundário traz recompensas externas, como cuidado, proteção ou status de vítima.

3. Como identificar um ganho secundário em mim?

Observe se existe algo que você ganha ao continuar com o problema — atenção, segurança, afeto ou até uma justificativa para não enfrentar algo temido.

4. O ganho secundário pode atrapalhar a terapia?

Sim. Ele pode gerar resistência inconsciente e dificultar o progresso terapêutico, fazendo com que o paciente volte repetidamente aos mesmos padrões.

5. Como a TCC ajuda a superar o ganho secundário?

Através da identificação de reforços ocultos, reestruturação cognitiva e substituição de ganhos disfuncionais por formas saudáveis de segurança e pertencimento.

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